2.6.07

I Wanna Love You Tender

Correndo o risco de quebrar algum tipo de eruditismo constante neste blog, não posso deixar passar a oportunidade de partilhar com quem quer que por aqui passe uma das maiores obras primas da feitura de videoclips musicais. É sem dúvida um tesouro, para ver com toda a família!



2.4.07

ironia

Pouco a pouco o passo faz-se vagabundo

dá-se a volta ao medo dá-se a volta ao mundo

diz-se do passado que está moribundo

bebe-se o alento num copo sem fundo

e vem-nos à memória uma frase batida

hoje é o primeiro dia do resto da tua vida

hoje é o primeiro dia do resto da tua vida

(Sérgio Godinho, O primeiro dia)

22.3.07

11.3.07

Yeni Hayat

"Depois tomei outros autocarros, apeei-me deles, vagueei pelas estações rodoviárias, voltei a tomar outros autocarros, dormi no assento, as noites sucediam-se aos dias. Tomei ainda outros autocarros, apeei-me deles em cidadezinhas; durante dias e dias viajei nas trevas e disse para mim mesmo que este jovem passageiro estava mesmo decidido a deixar-se levar pelas estradas que o levariam ao limiar desse outro universo."

in A Vida Nova (Orhan Pamuk)

5.3.07

Hallelujah

I heard there was a secret chord
That david played and it pleased the lord
But you don't really care for music, do you
Well it goes like this the fourth, the fifth
The minor fall and the major lift
The baffled king composing hallelujah

Hallelujah, hallelujah, hallelujah, hallelujah ....

Well your faith was strong but you needed proof
You saw her bathing on the roof
Her beauty and the moonlight overthrew you
She tied you to her kitchen chair
She broke your throne and she cut your hair
And from your lips she drew the hallelujah

Hallelujah, hallelujah, hallelujah, hallelujah .... .

Baby i've been here before
I've seen this room and i've walked this floor
I used to live alone before i knew you
I've seen your flag on the marble arch
But love is not a victory march
It's a cold and it's a broken hallelujah

Hallelujah, hallelujah, hallelujah, hallelujah ....

Well there was a time when you let me know
What's really going on below
But now you never show that to me do you
But remember when i moved in you
And the holy dove was moving too
And every breath we drew was hallelujah

Well, maybe there's a god above
But all i've ever learned from love
Was how to shoot somebody who outdrew you
It's not a cry that you hear at night
It's not somebody who's seen the light
It's a cold and it's a broken hallelujah

Hallelujah, hallelujah, hallelujah, hallelujah ....

(Leonard Cohen)

21.2.07

Espaços de nós

As janelas choram.
Correm os mantos de cetim da tua pele
sobre o negro linho.
Gotas, restos de ouro tocado pelo sol,
impenetráveis silêncios.

Passa uma vida,
enrodilhar de momentos fecundos
protegidos pela tua voz.
A busca de cada aroma, cada odor,
arrasta consigo a nostalgia de amanhã.

Estamos sós na continuidade do tempo
e fechamos os olhos à morte.
Restauremos a eternidade do sonho,
lembremos o leito, o descanso
e oiçamos o despertar da manhã.

20.2.07

Murmúrios do mar

Os naufrágios são belos
sentimo-nos tão vivos entre as ilhas, acreditas?
e temos saudades desse mar
que derruba primeiro no nosso corpo
tudo o que seremos depois

«Pago-te um café se me contares
o teu amor»

José Tolentino Mendonça (in A Noite Abre Meus Olhos)

12.2.07

LIFE

life is a vacancy
inhabited by people
male and female
as random as a meeting on a train
as close to one another as these lives are

life shakes us up
so hold me a little more tightly
at the station we get off, shed hot tears
a butterfly flies in
passing back and forth without let

Han Dong (in poetryinternational.org)

9.2.07

learned helplessness

O desespero (ou desamparo) aprendido é um conceito que emerge da psicologia experimental e que designa, grosso modo, a incapacidade de reagir a um estímulo aversivo, evitando-o. Um dos dispositivos experimentais mais ilustrativos consiste na administração de choques eléctricos a dois grupos de cães, sendo que apenas um (chamemos-lhe o 1º) tem a possibilidade de interromper a estimulação mediante a activação de um mecanismo. São depois deslocados para um setting em que uma fronteira é facilmente transponível. É aqui que o resultado se manifesta. O 2º grupo tinha aprendido a inutilidade de qualquer esforço e submete-se passivamente aos choques. A conclusão - óbvia e de inquestionável efeito - é que o meio tem a capacidade de anular o indivíduo, quando este não dispõe de estratégias que lhe permitam controlar os efeitos daquele. Parece-me, no entanto, haver uma segunda conclusão a extrair daqui. Ou talvez não uma conclusão, mas uma outra perspectiva. É o cão que, mortificando-se, anula o meio. Esta nuance tem somente a importância de uma mudança de poder. É uma deslocação do centro apenas visível nas consequências. De acordo com esta perspectiva, aquele que concede ao cão a possibilidade de fuga não poderia ser mais lesivo, ao corromper um mundo perfeitamente ordenado com novos significados. Na sua melancolia o cão é inteiramente, irrevogavelmente livre. Os outros nada podem acrescentar ou retirar. Como aquelas personagens de Gorki:

"Se notavam em qualquer estranho o menor aspecto extraordinário, os habitantes do bairro tratavam-no durante muito tempo com severidade, com uma repulsa instintiva, como se temessem vê-lo suscitar na sua existência algo que lhe quebrasse a regularidade melancólica, baça, mas tranquila. Acostumados a serem esmagados por uma força constante, não esperavam qualquer melhoria, e consideravam todas as mudanças como próprias apenas para tornar o seu jugo ainda mais pesado."

Máximo Gorki - A Mãe (tradução de Egito Gonçalves)

1.1.07

receita de ano novo

A intenção original deste post seria a de publicar o poema de Drummond ao qual usurpou o título e que começa assim

Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz, (...)

concluindo, num desses subtis arremedos de optimismo drummondianos

Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.

Há, no entanto, outro poema de Drummond que me tem servido (e com que abundância) como receita de ano novo. Este mais seco, lapidar, cansado, daqueles que posso evocar a qualquer momento em jeito de síntese (ou epitáfio).

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.